Um conjunto de entidades internacionais articulam um movimento global que exige o reconhecimento dos trabalhos de cuidado, seja ele remunerado ou não, como um valor social e econômico. Também reivindicam os cuidados como um direito humano. A Fetram-SC é uma das signatárias do manifesto e solicita às entidades que compõem a sua base a fazerem parte desse movimento.
São as mulheres as principais responsáveis por esse tipo de trabalho ao longo da história. O manifesto aponta que “em casa e dentro das comunidades, através de cadeias globais de cuidados […]as mulheres negras e pardas no Sul Global preenchem a lacuna de cuidados enquanto são mal remuneradas, em condições precárias de trabalho em todos os serviços”.
Abaixo segue o manifesto
Manifesto: Reconstruindo a organização social do cuidado
No centro dessas crises está o trabalho de cuidado que as mulheres têm historicamente realizado. O cuidado é a reprodução diária da vida, a base sobre a qual a própria vida – humana e planetária – existe e as economias funcionam.
A atual organização social do cuidado: como as necessidades de cuidado são atendidas; a inter-relação do trabalho de cuidado não remunerado, trabalho de cuidado mal remunerado, serviços públicos, privados e arranjos de cuidado baseados na comunidade são fundamentalmente desequilibrados, desiguais e insustentáveis. Esta situação faz com que o fardo, a carga e a maior parte do trabalho doméstico e de cuidado recaiam sobre as mulheres.
Em casa e dentro das comunidades, através de cadeias globais de cuidados em que as mulheres que vivem na pobreza, as mulheres negras e pardas no Sul Global preenchem a lacuna de cuidados enquanto são mal remuneradas, em condições precárias de trabalho em todos os serviços, tanto públicos quanto privados. Esta injustiça é duplicada e triplicada para as mulheres que experimentam formas múltiplas e intersetoriais de discriminação devido à classe, raça, orientação/identificação sexual, deficiência, idade ou status imigratório, entre outras dimensões.
Esta crise de cuidado, baseada na divisão internacional do trabalho em função do gênero e da raça, deve ser detida!
Os Estados muitas vezes usam de desculpa a falta de recursos financeiros pela sua incapacidade de realizar os direitos das mulheres. O sistema tributário internacional está quebrado – assim como o sistema econômico neoliberal em geral – e continua facilitando a extração de riqueza da população – particularmente do Sul Global – enquanto a concentra nas mãos de uma pequena elite – em sua maioria homens do Norte Global.
Enquanto isso, a desregulamentação, a privatização, a austeridade fiscal e o peso esmagador da dívida neocolonial fortalecem ainda mais estes extremos desequilíbrios de poder entre mulheres e homens, Sul Global e Norte Global, trabalhadores e corporações. Isto drena recursos financeiros a nível global e local, que serviria para financiar serviços públicos de cuidado de qualidade, permitindo um trabalho de cuidado decente, bem remunerado e com proteção social universal.
Neste contexto, políticas fiscais nacionais regressivas, muitas vezes incentivadas ou impostas por instituições financeiras internacionais, minam a responsabilidade dos Estados de prestar serviços públicos que garantam direitos.
Exigimos o fim do paradigma e do sistema econômico dominante que não só mina os direitos das mulheres, mas também exacerba a desigualdade de gênero. Exigimos o fim da falta de vontade, de alocação de recursos e de capacidade dos Estados para organizar os trabalhos de cuidado como um bem público. Rejeitamos e desafiamos a captura corporativa de muitos dos Estados que estão falhando em sua obrigação de respeitar, proteger e cumprir os direitos humanos. Exigimos que os Estados reconheçam os trabalhos de cuidado como um bem público e uma responsabilidade social coletiva, em vez de uma responsabilidade doméstica “privada” que recai principalmente sobre as mulheres. Este caminho leva à destruição da humanidade e do planeta, pois derruba as mulheres. Temos que acabar com isso agora!
Exigimos a criação de um movimento global para reconstruir a organização social do cuidado, unindo forças para isso:
- Reconhecer o valor social e econômico do trabalho de cuidado (remunerado e não remunerado) e o direito humano ao cuidado.
- Recompensar e remunerar trabalho de cuidado com salário igual para trabalho de igual valor, aposentadorias, condições de trabalho decentes e proteção social abrangente.
- Reduzir o fardo do trabalho não remunerado das mulheres.
- Redistribuir o trabalho de cuidado dentro das famílias, entre todos os trabalhadores, eliminando a divisão sexual do trabalho entre as famílias e o Estado.
Recuperar o caráter público dos serviços de cuidado e restaurar o dever e a responsabilidade primária do Estado de prestar serviços públicos de cuidado e desenvolver sistemas de cuidado que transformem as relações de gênero e a vida das mulheres, inclusive aumento a capacidade de investimento do Estado através de uma tributação justa e progressiva, garantindo a igualdade de direitos fiscais em nível internacional para os Estados.
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